Tempo rói
“Era uma vez uma rainha, que tinha medo de envelhecer, um dia o tempo decidiu parar...” Um trabalho sobre o tempo, que parece não passar, e rapidamente foge. A história duma mulher prisioneira num limbo, um tempo sem tempo, entre tradição e modernidade, ecos de uma vida já vivida, ou ainda a viver. Eu e uma grande boneca de cera, que lentamente derrete. Imprensa “Crostas de cera precipitam-se sobre o crânio da mulher, repetidamente, envelhecendo-a, cobrindo o cabelo como faz a neve nos campos. Ela dança a dança da repetição, cada vez mais rápida, animada. E toda a humanidade passa a frente, entre ela e nós: velhice, juventude, nascimento e morte...” Sharon Tofanelli e Andrea Bernardo, “Teatro.persinsala.it” Descrição Do Projeto Tempo Rói é o segundo capítulo de um projeto que deu origem a dois espetáculos. Estes debruçam-se sobre a relação entre mulher, tradição e contemporaneidade, tendo em comum o objeto cénico principal: uma escultura de 2,5 m inspirada nas Santas de roca. Santas de Roca, as esculturas religiosas Estas estátuas, construídas na Europa, a partir do século XV, eram utilizadas nos altares domésticos e nas procissões. Têm braços e pernas finamente entalhadas e pintadas e um corpo estilizado, vestido com roupa diferente conforme a ocasião. Hoje muitas destas esculturas perderam a função religiosa e são vendidas em lojas de antiguidades na forma mais simples, sem roupa. Quando pela primeira vez, vi uma destas imagens na montra duma loja, o impacto foi forte. Aquela figura nua, com olhos de santa, mantinha uma aura de sa- cralidade e ao mesmo tempo parecia uma boneca, um manequim abandonado. Era uma imagem de mulher, testemunha de uma história centenária, vendida como objeto de decoração. O cenógrafo João Calixto construiu uma estátua inspirada nas Santas de Roca, que evocasse a sua origem religiosa mas que fosse uma imagem universal de mulher. Este objeto è desmontável em pedaços e cada parte tem a sua historia. A base è uma estrutura em madeira em forma de saia, que pode evocar uma jaula ou uma roca de fiar... O corpete è de metal inspirado nos espartilhos das mulheres do séc XV e parece feito de grades. Braços e cabeça são de cera e podem derreter, assim como os ex-votos que todos os anos milhares de fiéis levam a Fátima. Primeiro capitulo: Santas de Roca, o espetáculo Santas de Roca é um espetáculo criado em colaboração com um grupo de mulheres de Alcanena. Estreou em Junho 2013 e acolhia no palco cinco mulheres não profissionais, duas bailarinas e a escultura inspirada nas Santas de Roca. As mulheres participaram a uma série de oficinas teatrais que, ao mesmo tempo, eram um espaço de partilha de experiências e recolha de material para a construção do espetáculo. A maioria dos textos do espetáculo nasceram do estudo do “repertório popular” português (músicas, provérbios, lenga-lengas, etc), da leitura de “Dias Felizes” de S. Beckett e das histórias de vida destas mulheres. Durante os ensaios, surgiu um segundo tema, complementar ao primeiro: a relação da mulher com o Tempo. Segundo capítulo: Tempo Rói Este espetáculo nasceu da vontade de aprofundar a pesquisa feita no projeto precedente, focando-me no tema que surgiu duma maneira muito evidente nas conversas com as mulheres de Alcanena, e que faz parte das minhas inquietações pessoais: a relação con- flituosa da mulher com o tempo. Esta relação reflecte algumas das grandes contradições da nossa época. O tempo bioló- gico, ao qual a mulher é fortemente ligada, entra em contraste com o nosso estilo de vida contemporâneo. Existe uma forte contraposição entre mulher-carreira e mulher-mãe, entre expetativas e desejos, natureza e sociedade. A falta de tempo, o medo do tempo que passa, o medo de envelhecer e de ver no próprio corpo os sinais do tempo, são preocupações constantes. O tempo é um mecanismo infernal que nos come lentamente, determina a nossa vida. Corremos atrás dele, tentamos pará-lo ou abrandá-lo, vivemos num contínuo conflito com ele, sabendo de antemão que vamos perder. Tempo Rói è um solo dançado e falado de uma mulher com uma grande boneca. Para a criação do texto voltei à pesquisa sobre o repertório popular e criei um conto inspirado nas lenga-lengas, que fala do nosso medo do tempo que passa e do desejo de imortalidade. O tic tac de um relógio está presente durante grande parte do espetáculo, variando de ritmo e tempo. Quis integrar estas mutações no meu corpo explorando diferentes pos- sibilidades de resposta. A cera e o fogo acompanham-nos durante todo o espetáculo. A cabeça da “santa” vai derretendo do início ao fim do espetáculo, metamorfoseando lentamente a cara até se desfazer. Ficha artística um projeto de e com: Costanza Givone assistência e co-criação: Susana Gaspar, João Vladimiro som: Stefano Ciardi luz: Luis Ternus objecto: João Calixto foto e video: João Vladimiro foto: Angelica D'Agliano produção: Costanza Givone co-produção: Associazione dello Scompiglio apoio financeiro: Fundação Calouste Gulbenkian residencias artisticas: Circolando, Fórum Dança/ Rumo do Fumo, Zdb/Negocio agradecimentos: Artemrede teatros associados, Crisitina Lorimer, João Nogueira, Maria José Passos, Cecilia Bertoni e toda a equipa do Teatro dello Scompiglio duração: 45 minutos faixa etária: maiores de 16 ( o espetáculo tem cenas de nu) |
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